Aquele barco já tinha alguns anos de idade. Seu motor continuava bom, porém o casco inevitavelmente envelhecia, e começavam a surgir marcas de ferrugem aqui e ali.
Apesar disso, o barco prosseguia seu cotidiano, indo e vindo conforme os planos de viagens que lhe estabeleciam. Freqüentemente participava de regatas e, estando entre seus semelhantes, sentia-se bem e confortado. Os encontros festivos mantinham-no motivado; exceto as procissões, das quais não gostava mesmo de participar. Nisso era diferente dos demais, pelo menos da maioria. Tinha plena convicção de não fora construído para fazer procissões!
Com o passar dos anos, o barco voltava cada vez menos ao seu estaleiro. Sentia uma leve melancolia por isso, mas as mudanças vindas com tempo eram imperdoáveis e o estaleiro já não o comportava bem como antes. Mas julgava que isso era superável, pois tinha várias certezas, entre as quais a de que não estava só.
Entretanto, os pensamentos também mudariam com o tempo. Um dia, percebeu-se só, em pleno oceano. Viu que não havia ninguém ao seu lado. E ao mesmo tempo que obedecia ao itinerário de cada viagem, sentia-se à deriva na própria vida. As certezas que tinha esquivaram-se furtivamente, e percebeu então, de súbito, que o oceano não era apenas infinito e vazio ao seu entorno, mas também profundo e frio abaixo de si. Então, começou a imergir.
4 comentários:
meu deus... muito melancólico... e acho q achei, hehehehe
Mas então era um submarino e não sabia???
Não, Matheus. Entre os significados de "imergir", estão "afundar", "entrar", "abismar-se", "sumir".
Desejos que irrompem quando a solidez das certezas é dissolvida no mar das dúvidas.
tá me parecendo um barquinho de papel...
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