29 de jun. de 2006

Página em construção

Acho muito engraçado quando entramos em alguma página da Internet em busca de alguma informação e encontramos apenas um “Página em Construção”. Ela está lá, tem nome, ocupa espaço, mas ao mesmo tempo é vazia, não tem informação. Significa apenas que não é, mas que pretende ser. Às vezes, encontrar uma página dessas pode ser frustrante: ela pode ter sido bem indicada, ter tido uma boa referência, mas por algum motivo está lá, parada, estática. Sem graça. E em algumas, a locução “em construção” é meramente um signo de esquecimento ou de abandono; não serão concluídas nunca; muitas nem sequer foram começadas...

Bom, falar de páginas da Internet é fácil, ainda mais quando se é um informata, meu caso; difícil é falar de mim mesmo. Porque, afinal, que credenciais eu tenho para falar sobre quem sou eu? Como se eu pudesse ter o dom da imparcialidade ao me descrever! Muito mais apropriado é descrever meus hábitos, citar do que gosto, discorrer sobre o que penso. Ou talvez já esteja, sem perceber, descrevendo uma característica minha.

O que sei, sobre mim, é que tenho aprendido muito. Não por estar numa nova faculdade, mas por estar vivendo de uma maneira mais lúcida. Isso não me impede de, vez por outra, cometer erros, imprudências e radicalismos, mas, na média, evita tais situações ou atenua seus efeitos. Mas que lucidez é essa?

Tive uma infância um tanto solitária, sendo filho caçula e temporão de uma família estabelecida mas, ao mesmo tempo, ausente. Por alguns motivos, fui uma criança muito insegura; achava-me – e realmente era – mais imaturo que meus colegas. Posso dizer que sentia mesmo vergonha da minha simples existência. Desejava muito fugir, desaparecer, começar tudo de novo. Foram anos bem complicados, aqueles.

Com a passagem para o segundo grau, mudei de escola. O ambiente novo era mais cosmopolita, pois possuía colegas de vários lugares e classes sociais distintas; os professores eram competentes e, na mesma medida, exigentes. De alguma forma vi uma possibilidade de construir uma nova imagem minha externa, mais forte. E isso foi fácil. Ganhei respeito, tornei-me uma liderança. Entretanto, alguma coisa, possivelmente interna, continuava errada. Seguidas vezes senti-me vazio, triste, só. Pior do que isso, dispensável. Como se eu tivesse uma carência infinita que jamais poderia ser sanada.

Quando vim finalmente morar em Porto Alegre, para fazer meu primeiro curso de graduação, dei um passo importante ao meu amadurecimento e à minha liberdade, mas trouxe comigo, ainda, essas questões não resolvidas. Tentei, então, encenar auto-suficiência. Isso foi desastroso, porque a confundi com desprezo e mesquinharia e acabei machucando e afastando pessoas de quem gostava muito.

Consegui ter uma reação quase imediata, como um raio que cai e ilumina a densa mata molhada pelo temporal. Percebi que as coisas e as pessoas, na grande maioria das vezes, eram mais simples e sinceras do que eu as imaginava. Percebi que minha desconfiança mostrava mais dos meus medos e da minha insegurança do que qualquer outra coisa. Infelizmente, esse momento iluminado aconteceu tarde demais para que fechasse todas as feridas abertas. Mas descobri a necessidade de ser transparente, de eliminar fingimentos, de parar de jogar. Com os outros, e principalmente, comigo.

Essa transparência me permitiu começar a entender minhas fraquezas, corrigir meus defeitos. Agora, aos trinta e dois anos, sinto-me mais aprendiz do que antes. Tenho aprendido a levar a vida de uma maneira positiva, tenho aprendido a não criar fantasmas na minha mente, aprendido a mudar. Mas é um longo trabalho, contínuo, cujo final eu não sei qual será, como será. Quando me vejo no espelho, posso me alegrar com as qualidades ou me entristecer com os defeitos. Mas nesse caso, não me desespero, porque vejo ali, no meio entre o coração e o cérebro, pendurada no pescoço, uma plaquinha dizendo “em construção”.

21 de jun. de 2006

Confissão

Quando eu era criança, fui uma vez a um restaurante muito chique com meus tios. Pedimos um filé à parmegiana. Fiquei impressionado com tanta carne, mas decepcionado com o recheio: dentro havia algo amarelo e derretido, que pensei obviamente tratar-se da gordura da carne. Achei nojento servirem uma carne assim, ainda mais com a gordura camuflada como recheio.
Tratei de raspar aquela porcaria fora, e pude me deleitar com aquele suculento e bem temperado pedaço de carne. O restaurante podia ser chique, mas a mim não enganariam! Deixei aquela coisa sebosa no prato, como testemunho da minha indignação.

14 de jun. de 2006

Verbos

Não é que eu não goste do buscar,
do encontrar,
do achar,
do pegar,
ou do largar;
eu só não conheço o Catar!

12 de jun. de 2006

Um Barco Sobre O Oceano

Aquele barco já tinha alguns anos de idade. Seu motor continuava bom, porém o casco inevitavelmente envelhecia, e começavam a surgir marcas de ferrugem aqui e ali.
Apesar disso, o barco prosseguia seu cotidiano, indo e vindo conforme os planos de viagens que lhe estabeleciam. Freqüentemente participava de regatas e, estando entre seus semelhantes, sentia-se bem e confortado. Os encontros festivos mantinham-no motivado; exceto as procissões, das quais não gostava mesmo de participar. Nisso era diferente dos demais, pelo menos da maioria. Tinha plena convicção de não fora construído para fazer procissões!
Com o passar dos anos, o barco voltava cada vez menos ao seu estaleiro. Sentia uma leve melancolia por isso, mas as mudanças vindas com tempo eram imperdoáveis e o estaleiro já não o comportava bem como antes. Mas julgava que isso era superável, pois tinha várias certezas, entre as quais a de que não estava só.
Entretanto, os pensamentos também mudariam com o tempo. Um dia, percebeu-se só, em pleno oceano. Viu que não havia ninguém ao seu lado. E ao mesmo tempo que obedecia ao itinerário de cada viagem, sentia-se à deriva na própria vida. As certezas que tinha esquivaram-se furtivamente, e percebeu então, de súbito, que o oceano não era apenas infinito e vazio ao seu entorno, mas também profundo e frio abaixo de si. Então, começou a imergir.

9 de jun. de 2006

Amicus certus in re incerta cernitur.

Muito de nada

Se uma das conseqüências imediatas do mundo altamente tecnológico atual é a facilidade com que as informações são disponibilizadas e acessadas, outra – e não menos marcante – é a enorme quantidade de informações disponíveis. São elas não apenas sobre as tecnologias propriamente ditas, mas também sobre toda a ebulição cultural e consumista que vivenciamos. Conseguem os jovens acadêmicos lidar com tanta informação? Segundo a pesquisadora e educadora argentina Ana Teberosky, os universitários “lêem textos variados, mas não se aprofundam em nada, em nenhuma leitura. Lêem de modo superficial e fragmentário, como quem assiste à televisão.”
A primeira pergunta que se impõe é se é possível se aprofundar em todas as leituras. Muitas vezes, na formação do jovem estudante, as leituras devem ser ágeis, quase sem compromisso, para que ele consiga se manter informado sobre tudo o que está acontecendo ao seu redor. Além disso, vai ler e estudar com profundidade o que for do seu interesse ou necessidade, pois demandam emprego dos fatores tempo e empenho. Então, por limitação desses fatores, e pela quase infinidade de assuntos disponíveis, é fácil verificar que o resultado é uma leitura leve e descomprometida com a maioria dos temas.
A segunda questão, talvez o anverso da anterior, é se é necessário o aprofundamento. Para usar termos da moda, somos “bombardeados por torrentes de informações”. Vale dizer que nem todas são úteis; e também nem todas são confiáveis. Assim, a indústria de entretenimento produz fatos e notícias sobre esses fatos, numa escala recursiva e exaustiva. Os periódicos – jornais, revistas – avultam com seus colunistas, cronistas e resenhistas, nem todos qualificados como se desejaria, ou que nem sempre discorrem sobre temas importantes como se esperaria. Todos podem escrever sobre tudo, e se um dia foi dito que o papel aceitava qualquer coisa, hoje podemos dizer que tudo já foi aceito e está na Internet. A um estudante universitário, então, cabe a tarefa de ler e selecionar aquilo que acrescenta à sua formação; imergir no que lhe pode ser útil.
Não é tarefa fácil essa busca constante, verdadeira perscrutação inconsciente. Até porque também toma tempo e empenho, como que numa metaintelecção de texto. Talvez felizes tenham sido os cientistas e filólogos renascentistas, que podiam ler, estudar e concentrar em si todo o conhecimento disponível, verdadeiras enciclopédias vivas. Para os estudantes do mundo moderno, seria mesmo interessante que houvesse algo como um controle remoto para usar em textos, dando zoom nos que fossem bons ou interessantes, pulando os que não calham, e desligando o aparelho antes de lerem bobagens.

5 de jun. de 2006

Bichos Estranhos

Já faz tanto tempo que moro aqui no sítio que quase não lembro como era viver na rua. Embora aqui ainda venham carros e aqueles carros ainda maiores, que rosnam muito, é certamente bem mais tranqüilo. O que não vejo muito aqui são cavalos puxando carroças, e sempre pensei que em sítios houvesse tanto cavalos quanto carroças! De qualquer forma, gosto muito daqui: tenho grandes amigos, fiz muitas namoradas – e devo ter uma dúzia de filhotes espalhados por aí, se meu faro não me engana! Além disso, na parte alta do sítio, criam-se gatos que podemos caçar à vontade. É muito divertido!
Aqui no sítio há muitas casas. Muitas, e todas um tanto parecidas. Quase todas têm duas camadas de janelas e, para se chegar nas segundas camadas, há uma infinidade de escadarias e rampas de acesso. Claro, não posso falar em casas sem falar em pessoas. E em muitas pessoas! Aqui chegam e daqui vão muitas pessoas todos os dias, mas por incrível que pareça, acho que morar no sítio não mora nenhuma.
Reparei que as pessoas mudam com o passar do tempo, quero dizer, de cada época de calor para a seguinte, vejo focinhos novos e deixo de ver outros tantos. Uma coisa muito curiosa é que, em alguns dias da época quente, as pessoas com focinhos novos acabam sendo presas, amarradas, mudam até de cor; e as pessoas com focinhos conhecidos ficam ao redor, rosnando, latindo, jogando umas águas bem mal-cheirosas. Uns coitados ficam fedendo mais do que eu depois de pegar chuva! Ainda bem que isso não ocorre durante todo o tempo, porque alguns focinhos-novos parecem não gostar disso.
Pessoas são bichos estranhos mesmo. Às vezes parecem adorar nossa companhia, fazem cafuné na minha barriga, tentam latir comigo, mas eu não entendo o que tentam dizer. Outras vezes, nos enxotam, nos xingam, nos chutam. E isso acontece muito quando nos aproximamos das casas que cheiram à comida, onde realmente acho que fazem comida. Pelo menos, de vez em quando ganho um restinho bem gostoso.
Uma coisa engraçada nas pessoas é que machos e fêmeas são muito parecidos. Já tentei distingui-los pelo tamanho dos pêlos na cabeça, mas não dá certo, pois ambos podem ter pêlos longos ou curtos. Machos podem ter ou não penugem perto do focinho, mas nunca vi uma fêmea que a tivesse. Ah, acho que fêmeas tem latido mais esganiçado que os machos, mas nem sempre.
Outra esquisitice das pessoas é que elas estão sempre entrando nas casas e depois saindo delas. De tempo em tempo, matilhas inteiras de pessoas adentram, ficam paradas olhando para uma pessoa que fica latindo de pé, depois saem todas de novo. As pessoas não parecem gostar muito de aproveitar o gramado, de correr pelas rampas, de caçar gatos. Ficam lá, dentro das casas. Que tédio deve ser! Mas na época fria, pelo menos, temos algo em comum com as pessoas: elas também gostam de lagartear quando a bola quente aparece.
Mas fico mesmo espantado de como há pessoas que colocam gravetos com brasa na boca. São gravetinhos pequenos, bem claros, mas com uma brasa na ponta! E o que é pior, quando não tem brasa, as próprias pessoas fazem aparecer uma! Será que são loucas? Não sabem que brasa queima e faz mal? Eu nunca chego perto de nada com fogo ou brasa, e acho que aprendi isso com minha mãe. Outro dia, por sinal, vi um grupinho de pessoas numa das casas lá do canto do sítio; todas elas passavam o gravetinho com brasa umas para as outras. Era um gravetinho bem pequeno, diferente dos outros, e tinha um cheiro bem forte. E não é que, apesar disso, as pessoas davam latidos de alegria? Pessoas são mesmo bichos estranhos!

2 de jun. de 2006

A Fúria da Gorda

Ainda me impressiono com a face oculta da amabilidade exagerada de certas pessoas. Pessoas dóceis, simpáticas, sociáveis e pacatas podem esconder sentimentos represados, desejos descabidos, energias desmedidas. Tudo do que precisam é um estopim, um momento oportuno e um motivo convincente para extravasar toda a concupiscência telúrica e mundana que não cabe mais em si. E isso ainda é mais forte, mais grave quando falamos de gordinhas, pois são retentoras potenciais de muito mais emoções veladas do que pessoas comuns.

Pois assim começou tudo. Vi Matheus conversando com a dócil moça, que parecia transitar muito bem entre os diversos grupos formados durante a noite. Fui até eles e integrei-me. Momentos depois estávamos somente ela e eu conversando. Percebi que tratava-se de alguém absorvente e aderente, daquelas que são capazes de sorver toda a atenção de uma pessoa a menos que sejam objetivamente dispensadas. Por esse motivo, evitei, durante toda a noite, dar atenção demasiada ou ainda permanecer só em companhia da avultada rapariga.

Assim, a noite foi passando. Não mais a interpelei diretamente, e notava apenas suas idas e vindas para cá e para lá. Nesses momentos sempre estava acompanhada de uma latinha de cerveja. Agora que os fatos passaram, a lucidez da distância temporal permite pensar e as emoções não mais gritam em meu peito, creio terem sido várias latinhas sucessivas.

Bom, voltei a perceber a Márcia – este era seu nome – quando já transtornada pela bebida e em incipiente ebulição de sentimentos, começara a praguejar contra Vasco por seu suposto descaso com a namorada, mortificada por leve embriaguez. E foi novamente com Vasco que se fez notar, desta vez fitando-o com olhares de fogo faiscante e ira repressora, após o menino-lobo tecer mais uma de suas metáforas escatológicas. Nesse momento meu olhar mirou ao infinito, porque a reprimenda ultrapassava qualquer limite de sanidade.

Depois disso os fatos sucederam-se numa avalanche caótica de terror violento. Fui aquecer-me junto à lareira, e vi que Márcia prontamente seguiu-me. Fingi-me adormecido no sofá, para que não travasse conversa com ela; cambaleou enquanto tentava acrescer folhas de jornal às toras abrasadas. Adormeci. Acordei com uma latinha gelada de cerveja nas minhas costas, arremessada pelo Vasco. Adormeci novamente; acordei agora com várias pessoas no entorno: Christian balbuciando coisas; Vasco não sei onde; Matheus e Márcia no sofá. “Napalm Death!” Matheus inclina-se para a frente, rindo (ele sempre ri, mas somente se inclina quando já está um tanto zonzo). Cerveja escorre sobre seu pescoço e cai no chão. Daniel passa e vê a cena de relance. Saímos para a churrasqueira.

Sucedem um pedido fogoso de desculpa, por parte da agressora, e a percepção, em Daniel, que Matheus vomitara em sua sala. Márcia cerca Matheus por todos os lados, “ela vem daqui, ela vem de lá”. Matheus senta-se e ri; Vasco e eu achamos que ele sucumbira aos seus fartos encantamentos.
Ela desaparece. Matheus suplica nossa ajuda e companhia. Decidimos ir aos potreiros, desbravar as matas e fugir da moça. Matheus, Daniel, Vasco e eu pegamos a fálica lanterna e embrenhamo-nos nos pastos do minifúndio. Ela vem. Ela nos segue. Ela pára na cerca. Paramos também. Uma paz breve toma nossas mentes. Focamo-la com a lanterna; está a rondar a cerca, como um cão de guarda nas portas do inferno. Deita-se. Fica escorada na cerca em posição obscena. Desaparece. Entra na casa. A luz do banheiro é acendida. No interior da casa, ouvem-se gemidos.

Foi com pavor repentino que notamos a luz do banheiro ser apagada. E ela volta. Sai para a área da churrasqueira, vem para a cerca. Pula a cerca. Corremos. Ela solta gritos ininteligíveis. Grunhidos. Uivos. Bate com as mãos em seus peitos saltitantes. Sacode os braços como se fossem asas. Ela percorre os prados em um trajeto desconexo, mas é fácil perceber que vem a nossa direção. Corremos. Corujas piam funestamente, como anunciando o pior. E ela continua vindo; tem o dom de enxergar na escuridão da noite. Continua correndo, grasnando, relinchando, gloterando.
Descemos a colina, em busca de algum lugar que sua visão não alcance. Ela some. Matheus volta um pouco colina acima, próximo da segunda cerca que puláramos. O pobre volta correndo apavorado: “Ela está vindo!”. Vamos mais adiante. Ela aproxima-se e convida com veemência para que adentremos no capão que está próximo. Negamos e decidimos voltar. A incansável Márcia vem atrás: “Voltem, galinhas! Vamos para o mato!” O sol já está nascendo; ela há de perder suas forças.
Quando chegamos à casa, uma sinistra névoa ainda cobria os vales a leste. Pensamos estar seguros na casa. Será que encontraríamos alguém vivo na casa? Ou ela teria matado um por um, em uma fúria punitiva?

Mais uma vez, lá vem ela. Ela vem. Aproxima-se. Decidimos subir no telhado da casa, pois Matheus a escutara confessando seu medo de altura. Ah, sábia decisão! Ali estaríamos ilhados, a espera de um helicóptero que viesse nos resgatar, mas estaríamos totalmente salvos daquele boitatá loiro que nos seguia.

Mas um dos efeitos interessantes do álcool no corpo humano é a perda gradativa das noções, dos limites, dos medos. Isso foi sobremaneira verdadeiro na gorda da cerca: ela subiu com determinação e velocidade no telhado da casa e, sem parecer ter qualquer vestígio de acrofobia. E numa tentativa de dança do acasalamento, correu atrás de Matheus circulando a clarabóia da casa. Resolvemos então, descer. Ela tentou subir na caixa d’água, mas devido às suas generosas formas não logrou alcançar o topo; ficou suspensa, com suas perninhas a balançar pelo vento da manhã. Era uma visão dantesca. Daniel, com razão, temeu por atos insensatos. Digo, por atos muito mais insensatos. Foi então resgatar a moça; levou-a para dentro da casa e a colocou a dormir.

O sol aquecia nossos rostos. Reunimo-nos em frente à bancada da churrasqueira. Sentei na própria bancada e via o sol descortinar o vale antes encoberto pela névoa matinal. Havia um certo clima de tranqüilidade.

Mas eis que ouço o ruído da porta a se abrir; sons próximos da mesa atrás de mim. Temo virar o rosto e olhar; segue-se um silêncio aterrador. Viro o rosto, apenas para confirmar que ela já entrara. Não. Ela está sentada atrás de mim, quase grudada ao meu corpo. O susto faz-me voar. Espatifar-me-ia no chão, não fosse o aparo providencial de Matheus. Começo a rir; nada faz mais sentido. Que o chão me engula e as árvores sequem. É um circo!


“Cuidado com a gorda,
que a gorda te pega.
Te pega daqui,
Te pega de lá.”

1 de jun. de 2006