Quem nasce lagartixa nunca vira jacaré.
Mas, vez por outra, perde o rabo!
29 de out. de 2007
19 de out. de 2007
Estado e religião
Sou católico de batismo, mas não professo a fé há muitos anos. Entre os vários rótulos que podem me atribuir, considero "agnóstico" o menos pretensioso. Dito isso, quero abordar um assunto em que penso seguidamente: a relação entre estado e religião. Começo o texto refletindo sobre as causas da tão propalada harmonia inter-religiosa que existe no país.
É fato que ela existe. Mas não sei se sua causa principal seja, de fato, a boa vontade ou a tolerância inata do brasileiro. Já fomos um país oficialmente católico e ainda o somos estatisticamente. Mas que tipo de catolicismo praticamos (pretérito perfeito e presente) aqui? Um catolicismo lânguido, sem muita vontade com suas obrigações, ao exemplo do que somos como sociedade em geral. Parece-me que até na religião tratamos as questões com "jeitinho".
Muito se tem falado sobre essa praga cultural nacional, que vai do burlesco furar fila do cinema até os grandes escândalos de corrupção em Brasília, passando pela cumplicidade com a pirataria e o contrabando e pela complacência, por vezes pasmada, a tudo isso. Essa indiferença, quase generalizada, que faz com que não batalhemos cotidianamente por uma sociedade melhor, calcada no exemplo individual. Talvez esse "tanto fez, tanto faz", transposto ao campo religioso, é que tenha nos levado a essa convivência harmoniosa. Sim, porque me lembro muito bem de ler, nas cartilhas de catequese e de crisma, condenações veementes a outros tipos de manifestações religiosas, mormente ao espiritismo e ao candomblé. Por que essas condenações nunca tiveram um efeito belicoso? Creio que é pelo mesmo motivo que leva o católico brasileiro médio a não ir à missa, a não comungar, a não confessar, a não pagar o dízimo. Se for assim, o jeitinho, através de seu viés de indolência religiosa, acabou por produzir a boa convivência entre credos tão distintos,
inclusive o sincretismo.
Outro ponto que me chama atenção é a questão dos direitos civis. Temos avançado muito nesse campo, e há muito ainda a ser discutido e decidido. Mas fazemos isso a despeito das orientações de Roma. Divórcio e inseminação artificial são alguns dos exemplos que me vêm à memória agora. Mas vale dizer que as âncoras papais não são os únicos entraves ao avanço das conquistas civis. Lembro um caso de médicos que precisaram de garantir na justiça uma transfusão de sangue para um menino criticamente doente, porque a agremiação religiosa de seus pais considerava tal ato ofensivo a deus, o que os fez proibirem a transfusão.
Isso posto, vale dizer que estamos muito mais avançados em jurisprudência do que em legislação, uma vez que nossos legisladores têm o débito moral com seus eleitores e, muitas vezes, não avançam em questões cruciais por temerem comprometer suas reeleições. Nesse contexto, causa-me preocupação o crescimento de certas linhas neopentecostais efusivas, especialmente quando associadas a meios de comunicação em massa. Em suas pregações, os pastores e bispos, muitos autoproclamados, não escondem seu desamor ao catolicismo, à umbanda e a tudo que for diferente e não lhes pagar o dízimo. E sua condenação veemente atinge, obviamente, tudo que não se encaixar nas leituras inspiradas que fazem da bíblia, muitas vezes literais.
Diante desse cenário, cabe a pergunta: a harmonia religosa será mantida caso cristãos exaltados passem a ser maioria da população? Até que ponto os direitos civis estabelecidos estão garantidos? Até onde é possível manter um estado de direito - e de fato - laico, se a população entrar em ebulição ou conflitos religiosos? É certo que o estado brasileiro ainda sofre de lacunas na sua laicidade, como os feriados católicos e os crucifixos suspensos na maior parte das repartições públicas. Ou ainda como a lei estadual que permite sacrifício de animais para oferenda em cerimônias de origem africana. Mas felizmente, a ingerência religiosa acaba por aí. Por enquanto.
É fato que ela existe. Mas não sei se sua causa principal seja, de fato, a boa vontade ou a tolerância inata do brasileiro. Já fomos um país oficialmente católico e ainda o somos estatisticamente. Mas que tipo de catolicismo praticamos (pretérito perfeito e presente) aqui? Um catolicismo lânguido, sem muita vontade com suas obrigações, ao exemplo do que somos como sociedade em geral. Parece-me que até na religião tratamos as questões com "jeitinho".
Muito se tem falado sobre essa praga cultural nacional, que vai do burlesco furar fila do cinema até os grandes escândalos de corrupção em Brasília, passando pela cumplicidade com a pirataria e o contrabando e pela complacência, por vezes pasmada, a tudo isso. Essa indiferença, quase generalizada, que faz com que não batalhemos cotidianamente por uma sociedade melhor, calcada no exemplo individual. Talvez esse "tanto fez, tanto faz", transposto ao campo religioso, é que tenha nos levado a essa convivência harmoniosa. Sim, porque me lembro muito bem de ler, nas cartilhas de catequese e de crisma, condenações veementes a outros tipos de manifestações religiosas, mormente ao espiritismo e ao candomblé. Por que essas condenações nunca tiveram um efeito belicoso? Creio que é pelo mesmo motivo que leva o católico brasileiro médio a não ir à missa, a não comungar, a não confessar, a não pagar o dízimo. Se for assim, o jeitinho, através de seu viés de indolência religiosa, acabou por produzir a boa convivência entre credos tão distintos,
inclusive o sincretismo.
Outro ponto que me chama atenção é a questão dos direitos civis. Temos avançado muito nesse campo, e há muito ainda a ser discutido e decidido. Mas fazemos isso a despeito das orientações de Roma. Divórcio e inseminação artificial são alguns dos exemplos que me vêm à memória agora. Mas vale dizer que as âncoras papais não são os únicos entraves ao avanço das conquistas civis. Lembro um caso de médicos que precisaram de garantir na justiça uma transfusão de sangue para um menino criticamente doente, porque a agremiação religiosa de seus pais considerava tal ato ofensivo a deus, o que os fez proibirem a transfusão.
Isso posto, vale dizer que estamos muito mais avançados em jurisprudência do que em legislação, uma vez que nossos legisladores têm o débito moral com seus eleitores e, muitas vezes, não avançam em questões cruciais por temerem comprometer suas reeleições. Nesse contexto, causa-me preocupação o crescimento de certas linhas neopentecostais efusivas, especialmente quando associadas a meios de comunicação em massa. Em suas pregações, os pastores e bispos, muitos autoproclamados, não escondem seu desamor ao catolicismo, à umbanda e a tudo que for diferente e não lhes pagar o dízimo. E sua condenação veemente atinge, obviamente, tudo que não se encaixar nas leituras inspiradas que fazem da bíblia, muitas vezes literais.
Diante desse cenário, cabe a pergunta: a harmonia religosa será mantida caso cristãos exaltados passem a ser maioria da população? Até que ponto os direitos civis estabelecidos estão garantidos? Até onde é possível manter um estado de direito - e de fato - laico, se a população entrar em ebulição ou conflitos religiosos? É certo que o estado brasileiro ainda sofre de lacunas na sua laicidade, como os feriados católicos e os crucifixos suspensos na maior parte das repartições públicas. Ou ainda como a lei estadual que permite sacrifício de animais para oferenda em cerimônias de origem africana. Mas felizmente, a ingerência religiosa acaba por aí. Por enquanto.
18 de out. de 2007
Dúvidas
Até que ponto podemos nos entristecer com uma pequena decepção?
Até que ponto pequenas decepções seguidas podem afetar uma relação?
É mesmo possível não esperarmos nada de alguém próximo? É esse o ideal?
Laisse faire, e é lucro o que vier!
Quando não hesitamos em fazer algo que pode aborrecer a outra parte, é por que confiamos na solidez da relação, ou por que já não nos importamos com o (impacto no) outro?
Onde fica, afinal, o botão do "foda-se"?
Até que ponto pequenas decepções seguidas podem afetar uma relação?
É mesmo possível não esperarmos nada de alguém próximo? É esse o ideal?
Laisse faire, e é lucro o que vier!
Quando não hesitamos em fazer algo que pode aborrecer a outra parte, é por que confiamos na solidez da relação, ou por que já não nos importamos com o (impacto no) outro?
Onde fica, afinal, o botão do "foda-se"?
9 de out. de 2007
Dois lados
A beleza
De não se mandar no coração
É que os sentimentos
Não podem ser comprados.
A tristeza
De não se mandar no coração
É que os sentimentos
Não podem ser cobrados.
A vida é um cafife sentimental!
De não se mandar no coração
É que os sentimentos
Não podem ser comprados.
A tristeza
De não se mandar no coração
É que os sentimentos
Não podem ser cobrados.
A vida é um cafife sentimental!
19 de set. de 2007
SVQR: O Senado e a Vergonha de Roma
Com os sucessivos escândalos vindos do Senado Federal, a casa mostra sua incapacidade de lidar com eles de uma forma eficaz e que esboce algum tipo de apego à ética política e à honra. O corporativismo retórico acaba por gerar mais escândalos, paralisa os trabalhos que deveriam ser executados e expõe ao ridículo (ou ao deplorável) um dos componentes do legislativo federal.
Mais do que isso, põe em xeque a própria razão de ser do Senado. Vários meios de comunicação nacionais, mormente revistas, colocam em pauta a possibilidade de extinção do Senado. Obviamente a reação dos senadores foi exaltada e contrária a qualquer menção nesse sentido. Não poderia ser diferente, pois a norma de comportamento de seres humanos indica que não gostam de alterar seu status quo se este lhes for proveitoso. Ora, é sabido que muito executivo de multinacional não ganha um salário tão polpudo quanto o dos senadores. E certamente quase nenhum deve ter um horário de trabalho tão flexível e exíguo. E a estabilidade por 8 anos...
Mas, afinal, qual a função do Senado? A menos de funções específicas constitucionais, o Senado faz exatamente o mesmo que a Câmara: legisla (faz leis) e fiscaliza o executivo. E em relação às funções específicas constitucionais, elas couberam ao Senado porque já existia o Senado quando a Constituição foi feita. Um senador não tem DNA especial ou formação acadêmica superior a um deputado para que tais funções devam caber somente aos senadores. Tanto é verdade, que a cada eleição, muitos deputados almejam virar senadores!
Claro que, em vista disso, a retórica retumbante e desesperada dos senadores joga frases de efeito aos ouvidos moucos da população, para que a impressionem e tentem impedir o acolhimento da idéia. O discurso agarra-se em "valores democráticos" e "cláusulas pétreas" da Constituição, como seriam o pacto federativo e o equilíbrio regional.
Pois o Senado é justamente um fator de desiquilíbrio na representatividade regional! A região Sul, por exemplo, tem 13% da população do país e 11% dos senadores. A região Nordeste tem 25% da população, mas 33% de senadores. Mas não pára por aí: a região Norte, que tem somente 7% da população, tem milagrosos 26% do Senado Federal! Isso não é acalentar a desigualdade regional?
Pois bem. Em resposta a isso, argumentarão que os senadores representam os entes federados e, portanto, essa representatividade correspondente à população cabe à Câmara. Balela! Primeiro, porque as fórmulas empregadas para a distribuição de deputados também causam distorção, ainda que em menor grau. Segundo, porque o princípio de eleição de um senador é exatamente o mesmo que elege um deputado: votação direta do povo. Claro, no caso da eleição de um senador, contam somente os votos individuais recebidos e não há coeficiente eleitoral. Mas é o mesmo povo que vota nos deputados que elege os senadores. Não há vinculação nenhuma, por exemplo, entre o senador eleito e o governador do estado de origem, ou entre o senador e a respectiva assembléia legislativa; no fim, é apenas mais um político eleito para estar em Brasília. A representação propalada do ente federado fica no plano da divisão dos gabinetes, mas perde-se completamente na origem.
A questão de existir ou não Senado é bem mais importante e menos intocável do que parece. Não é mais grave ou visceral, nem menos fundamental do que escolher entre presidencialismo e parlamentarismo, escolha que já fizemos. E há de se lembrar que há muitos países que funcionam muito bem com um simples congresso unicameral. No fim, o Brasil possui duas câmaras legislativas que conflitam e barganham diferente e inconsistentemente com o executivo, isso quando não os fazem entre si. É custo em dinheiro, é custo em tempo. E neste país, há falta dos dois!
19 de jul. de 2007
O Sermão da Sexagésima Segunda
Abaixo consta o enunciado da questão 62:
Como alternativa correta a esta questão, publicada no gabarito da prova, foi apresentada a letra “D”, indicando que apenas as situações I e III impedem o antivírus de detectar um vírus.
Certamente a intenção da Comissão do Concurso ao fazer a questão foi testar o conhecimento do candidato sobre a possibilidade de as ferramentas de antivírus poderem esquadrinhar um arquivo compactado, examinando cada um de seus componentes à procura de vírus.
Entretanto, a alternativa assim posta como correta, por ingenuidade, descuido ou esquecimento, ignora o fato de que as ferramentas de antivírus não podem fazer a análise de arquivos compactados se os mesmos estiverem protegidos por senha.
Senão vejamos a informação que se encontra no sítio da Computer Associates - CA, reconhecida empresa de tecnologia da informação, numa página que instrui sobre como usuários devem enviar exemplos de vírus para análise (em http://www3.ca.com/securityadvisor/newsinfo/collateral.aspx?CID=33514):
Bem, o texto acima diz, em bom português, que o usuário deve “comprimir e proteger por senha (grifo original) seu arquivo antes de submetê-lo aos pesquisadores da empresa. Se o usuário não comprimir e proteger por senha o arquivo, ele pode ser interceptado ou bloqueado e falhar em alcançar a empresa.”.
Ora, isso implica dizer que a proteção por senha impede a análise do conteúdo do arquivo compactado, e a sua possível interceptação. Ainda neste sentido, podemos ver o que a empresa Techs, sediada em Araraquara, explica aos seus usuários pela proibição do envio de arquivos compactados protegidos por senha, no item de letra “j”, dentro da sua página de perguntas mais freqüentes (em http://www.techs.com.br/EmailProtegido/Geral/Faq.shtm#j)
A restrição imposta por essa empresa, talvez drástica, tem um único mas insofismável motivo: arquivos compactados e protegidos por senha não podem ser analisados por uma ferramenta de antivírus.
Diante de todo o exposto, fica evidente que arquivos armazenados no computador, ou enviados pela Internet, armazenados de forma compactada podem impedir sim que a ferramenta antivírus detecte um vírus dentro deles.
A proteção por senha em um arquivo compactado impede a perscrutação ao(s) seu(s) componente(s), permitindo apenas que informações mais gerais como nome e tamanho do(s) mesmo(s) sejam acessados.
Assim sendo, é fácil perceber que o enunciado da questão foi insuficiente para contemplar as possibilidades que envolvem o processo de compactação de arquivos, bem como a característica – cada vez mais comum – de proteção através de senhas.
Por tal imprecisão, o candidato com o conhecimento adequado exigido para este concurso pode ter ficado hesitante em decidir a alternativa correta e, por fim, pode ter marcado – e frisemos que acertadamente – a alternativa “E” como correta, que abrange também a situação exposta de número II.
É possível a Comissão pensar no contra-argumento de que a proteção por senha esconde, na verdade, um processo de criptografia, fato este que portanto seria enquadrado pelo item III. Mas novamente surge a formulação do enunciado da questão: “armazenados na forma compactada”. Quando um software de compactação é utilizado, a compressão dos dados é sua finalidade primeira, fundamental. Prova evidente disso é que justamente são chamados “programas de compactação” e não “programas de cifragem”. A criptografia simétrica aí empregada, mormente o Advanced Encryption Standard ou correlatos, nada mais é do que um instrumento a se conseguir o benefício adicional da proteção por senha, ou seja, uma atividade-meio, acessória, secundária. E prova cabal disso é que os arquivos compactados e protegidos por senha, vale dizer, cifrados, mantêm as mesmas extensões e associações de programas daqueles que simplesmente são compactados sem processo adicional, porque o fator importante, determinante, suficiente e necessário é estarem compactados, estando ou não cifrados. Destarte, essa alegação não tem consistência e, não sendo consistente, não faz mais do que mostrar, outra vez, a formulação incompleta, equivocada e ambígua da questão.
A Comissão também não pode usar tal argumento porque o Edital de Abertura do Concurso não exige do candidato conhecimento aprofundado sobre programas de compactação. Na página 10 do mesmo, vemos a única referência do programa da prova à questão de antivírus:
Se a intenção do formulador da questão foi versar sobre a capacidade de os antivírus poderem descompactar arquivos para a verificação das assinaturas, deveria ter ele explicitado, de alguma forma, que os arquivos haviam sido submetidos a um puro e simples processo de compactação, sem procedimentos adicionais. Ao não fazê-lo, citando apenas “armazenados em forma compactada”, deixou questão em aberto se os arquivos referidos estão, ou não, protegidos por senha, permitindo ao candidato considerar fundamentadamente ambas as hipóteses.
Além disso, se o algoritmo de compactação for inédito, experimental ou estranho, e o computador não lhe oferecer suporte para a descompressão dos dados, a ferramenta de antivírus também nada poderá fazer para descompactar arquivos, impossibilitando a varredura dos mesmos. E nesse caso não é possível argumentar-se qualquer coisa. Algoritmos de compactação têm finalidade e funcionamento totalmente diferentes de algoritmos de cifragem. Entretanto, se o algoritmo compactador não for reconhecido pelo sistema operacional do computador ou pela ferramenta de antivírus, pelos motivos acima descritos, a mesma não detectará nada no arquivo assim compactado, ainda que infectado.
Pode-se citar como exemplo irrefutável desse cenário o recebimento e arquivamento de um arquivo compactado com o sistema ARJ. Tal sistema era muito comum nos meios informáticos nas décadas de 1980 e 1990, mas caiu em desuso, suplantado pelos concorrentes. Ora, ainda existem arquivos compactados nessa forma, mas os computadores atuais não têm capacidade de descomprimi-los de forma automática, nem os antivírus de detectarem vírus dentro deles. No entanto, são pura e simplesmente arquivos compactados.
De uma forma ou de outra, a questão falha ao não especificar em que condições o tal armazenamento “em forma compactada” foi realizado. Se ao candidato faltam informações e definições, às respostas sobram alternativas. E essa falta de clareza não se admite em uma prova de concurso público.
Assim sendo, uma questão que, por um lado, contém em seu enunciado uma lacuna de precisão e, de outro, uma resposta totalmente questionável porque admite, sem discussão, também outra resposta, deve ser imperiosamente anulada.
Um programa antivírus pode detectar vírus através das suas assinaturas, procurando-as em todos os arquivos armazenados em um computador. Assim sendo, considere as situações propostas abaixo:
I - A base de dados das assinaturas não vem sendo atualizada freqüentemente.
II - Arquivos estão sendo armazenados no computador de forma compactada.
III - Arquivos estão sendo armazenados no computador de forma cifrada.
Quais delas poderiam impedir o antivírus de detectar um vírus?
(A) Apenas I
(B) Apenas II
(C) Apenas III
(D) Apenas I e III
(E) I, II e III
Como alternativa correta a esta questão, publicada no gabarito da prova, foi apresentada a letra “D”, indicando que apenas as situações I e III impedem o antivírus de detectar um vírus.
Certamente a intenção da Comissão do Concurso ao fazer a questão foi testar o conhecimento do candidato sobre a possibilidade de as ferramentas de antivírus poderem esquadrinhar um arquivo compactado, examinando cada um de seus componentes à procura de vírus.
Entretanto, a alternativa assim posta como correta, por ingenuidade, descuido ou esquecimento, ignora o fato de que as ferramentas de antivírus não podem fazer a análise de arquivos compactados se os mesmos estiverem protegidos por senha.
Senão vejamos a informação que se encontra no sítio da Computer Associates - CA, reconhecida empresa de tecnologia da informação, numa página que instrui sobre como usuários devem enviar exemplos de vírus para análise (em http://www3.ca.com/securityadvisor/newsinfo/collateral.aspx?CID=33514):
“...
Additional instructions for compressing samples:
Please compress and password-protect your file before submitting it to our researchers. If you do not compress and password-protect the file, it may be intercepted or blocked and fail to reach us.
....”
Bem, o texto acima diz, em bom português, que o usuário deve “comprimir e proteger por senha (grifo original) seu arquivo antes de submetê-lo aos pesquisadores da empresa. Se o usuário não comprimir e proteger por senha o arquivo, ele pode ser interceptado ou bloqueado e falhar em alcançar a empresa.”.
Ora, isso implica dizer que a proteção por senha impede a análise do conteúdo do arquivo compactado, e a sua possível interceptação. Ainda neste sentido, podemos ver o que a empresa Techs, sediada em Araraquara, explica aos seus usuários pela proibição do envio de arquivos compactados protegidos por senha, no item de letra “j”, dentro da sua página de perguntas mais freqüentes (em http://www.techs.com.br/EmailProtegido/Geral/Faq.shtm#j)
j) Por que não consigo enviar arquivo(s) compactado(s) com senha? Recebo o erro PASSWORD PROTECTED.
Por medidas de segurança não permitimos que arquivos compactados com senha (possívelmente podem conter vírus) sejam enviados através dos nossos servidores.
A restrição imposta por essa empresa, talvez drástica, tem um único mas insofismável motivo: arquivos compactados e protegidos por senha não podem ser analisados por uma ferramenta de antivírus.
Diante de todo o exposto, fica evidente que arquivos armazenados no computador, ou enviados pela Internet, armazenados de forma compactada podem impedir sim que a ferramenta antivírus detecte um vírus dentro deles.
A proteção por senha em um arquivo compactado impede a perscrutação ao(s) seu(s) componente(s), permitindo apenas que informações mais gerais como nome e tamanho do(s) mesmo(s) sejam acessados.
Assim sendo, é fácil perceber que o enunciado da questão foi insuficiente para contemplar as possibilidades que envolvem o processo de compactação de arquivos, bem como a característica – cada vez mais comum – de proteção através de senhas.
Por tal imprecisão, o candidato com o conhecimento adequado exigido para este concurso pode ter ficado hesitante em decidir a alternativa correta e, por fim, pode ter marcado – e frisemos que acertadamente – a alternativa “E” como correta, que abrange também a situação exposta de número II.
É possível a Comissão pensar no contra-argumento de que a proteção por senha esconde, na verdade, um processo de criptografia, fato este que portanto seria enquadrado pelo item III. Mas novamente surge a formulação do enunciado da questão: “armazenados na forma compactada”. Quando um software de compactação é utilizado, a compressão dos dados é sua finalidade primeira, fundamental. Prova evidente disso é que justamente são chamados “programas de compactação” e não “programas de cifragem”. A criptografia simétrica aí empregada, mormente o Advanced Encryption Standard ou correlatos, nada mais é do que um instrumento a se conseguir o benefício adicional da proteção por senha, ou seja, uma atividade-meio, acessória, secundária. E prova cabal disso é que os arquivos compactados e protegidos por senha, vale dizer, cifrados, mantêm as mesmas extensões e associações de programas daqueles que simplesmente são compactados sem processo adicional, porque o fator importante, determinante, suficiente e necessário é estarem compactados, estando ou não cifrados. Destarte, essa alegação não tem consistência e, não sendo consistente, não faz mais do que mostrar, outra vez, a formulação incompleta, equivocada e ambígua da questão.
A Comissão também não pode usar tal argumento porque o Edital de Abertura do Concurso não exige do candidato conhecimento aprofundado sobre programas de compactação. Na página 10 do mesmo, vemos a única referência do programa da prova à questão de antivírus:
Segurança da Informação - Conceitos gerais de Segurança da Informação. Noções de Normas ISO para gestão de segurança da informação. Proteção contra vírus e outras formas de softwares ou ações intrusivas. Noções de criptografia, assinatura e certificação digital.Então, de um lado temos a informação comprovada de que os programas antivírus não conseguem fazer a análise de arquivos compactados protegidos por senha e, de outro lado, nem o programa da prova do concurso, tampouco a bibliografia por ele apresentada, fazem referência aos detalhes de funcionamento dos programas de compactação. Então, o candidato preparado com o conhecimento exigido para a prova houve de considerar a assertiva II pertinente à resposta da questão. Porque não lhe foi demandado conhecimento sobre os meandros dos aplicativos de compactação, mas tão somente sobre as formas de proteção contra vírus.
Se a intenção do formulador da questão foi versar sobre a capacidade de os antivírus poderem descompactar arquivos para a verificação das assinaturas, deveria ter ele explicitado, de alguma forma, que os arquivos haviam sido submetidos a um puro e simples processo de compactação, sem procedimentos adicionais. Ao não fazê-lo, citando apenas “armazenados em forma compactada”, deixou questão em aberto se os arquivos referidos estão, ou não, protegidos por senha, permitindo ao candidato considerar fundamentadamente ambas as hipóteses.
Além disso, se o algoritmo de compactação for inédito, experimental ou estranho, e o computador não lhe oferecer suporte para a descompressão dos dados, a ferramenta de antivírus também nada poderá fazer para descompactar arquivos, impossibilitando a varredura dos mesmos. E nesse caso não é possível argumentar-se qualquer coisa. Algoritmos de compactação têm finalidade e funcionamento totalmente diferentes de algoritmos de cifragem. Entretanto, se o algoritmo compactador não for reconhecido pelo sistema operacional do computador ou pela ferramenta de antivírus, pelos motivos acima descritos, a mesma não detectará nada no arquivo assim compactado, ainda que infectado.
Pode-se citar como exemplo irrefutável desse cenário o recebimento e arquivamento de um arquivo compactado com o sistema ARJ. Tal sistema era muito comum nos meios informáticos nas décadas de 1980 e 1990, mas caiu em desuso, suplantado pelos concorrentes. Ora, ainda existem arquivos compactados nessa forma, mas os computadores atuais não têm capacidade de descomprimi-los de forma automática, nem os antivírus de detectarem vírus dentro deles. No entanto, são pura e simplesmente arquivos compactados.
De uma forma ou de outra, a questão falha ao não especificar em que condições o tal armazenamento “em forma compactada” foi realizado. Se ao candidato faltam informações e definições, às respostas sobram alternativas. E essa falta de clareza não se admite em uma prova de concurso público.
Assim sendo, uma questão que, por um lado, contém em seu enunciado uma lacuna de precisão e, de outro, uma resposta totalmente questionável porque admite, sem discussão, também outra resposta, deve ser imperiosamente anulada.
5 de jun. de 2007
Confiança
Um profissional da área de segurança de informações sabe que a manutenção do sigilo de senhas é um dos fundamentos da credibilidade de qualquer sistema. Algumas diretivas que devem ser observadas são o uso de senhas diferentes para cada finalidade, a troca periódica - preferencialmente mensal - de todas elas, a não repetição de senhas usadas e a utilização dos mais variados tipos possíveis de caracteres. Dessa maneira, na maioria das situações, o custo para quebrar uma senha ou chave criptográfica envolve muito mais esforço e custo do que o benefício trazido com a sua descoberta.
Infelizmente, profissionais da área sabem que essas diretivas são dificilmente seguidas, e que a manutenção do sigilo é uma regra freqüentemente ignorada. Isso pode deixá-los normalmente frustados ou revoltados, mas a vida acaba ensinando que há, pelo menos, três motivos razoáveis, senão fortes, para esse aparente descuido. Um primeiro motivo é a pouca importância que o bem ou sistema protegido pela senha possa ter, ou o pequeno prejuízo decorrente de um uso possivelmente mal-intencionado. Um segundo motivo é alguma necessidade urgente, alguma situação que exija o compartilhamento desse segredo para a obtenção de uma finalidade maior. E o terceiro e mais nobre dos motivos resume-se a uma simples palavra: confiança.
Confiança é algo difícil de definir em toda sua amplitude, mas é algo bom de ser sentido. Mas é fácil trazer à tela com exemplos. Confiança é precisar de compartilhar uma senha de correio eletrônico ou de acesso a sistemas e saber que não terá a privacidade invadida, nem será alvo de atitudes maliciosas ou fraudulentas. Claro, nem sempre haverá tal necessidade mas, existindo, como é bom e gratificante saber que se pode contar contar com a ajuda de outra pessoa, e que a informação passada está segura e a salvo.
Mas confiança vai muito além de exemplos da vida digital. Pode ser também emprestar algo valioso, afetiva ou financeiramente. Emprestar uma coleção de discos importados do filme preferido, precioso, é também uma forma de demonstrar esse crédito. E se os discos fossem danificados? A confiança está não apenas depositada no desejado zelo que o depositário tomará, mas também na sua atitude caso ocorra algum problema. Simples assim. E dessa mesma forma, um carro pode ser emprestado, tanto para uma noitada amorosa de um amigo, quanto para outro que dele necessite para uma longa viagem profissional.
Uma das formas mais simples e, ao mesmo tempo, controversa e profunda da demonstração desse sentimento, é o empréstimo de uma escova de dentes a um amigo. A escova de dentes é tida como algo muito íntimo, indevassável, que não pode ser passada a outra boca que não a do proprietário. Puro tabu! Se o amigo é confiável e se seus hábitos sanitários são conhecidos e adequados, é muito melhor pedir-lha emprestada do que passar um turno com a boca sendo devastada por açúcares e suas fermentações. Claro que essa não é uma situação ideal, mas é uma possibilidade de higiene que deve ser considerada. Para os assombrados, ela pode ter o impacto psicológico atenuado pela comparação com um simples beijo. Se o amigo é digno de ser beijado (por alguém), então é digno de receber (ou ceder) a escova. No fim, apenas uma questão de confiança, com as vantagens de refrescância e de anti-sepsia da pasta dental.
Infelizmente, profissionais da área sabem que essas diretivas são dificilmente seguidas, e que a manutenção do sigilo é uma regra freqüentemente ignorada. Isso pode deixá-los normalmente frustados ou revoltados, mas a vida acaba ensinando que há, pelo menos, três motivos razoáveis, senão fortes, para esse aparente descuido. Um primeiro motivo é a pouca importância que o bem ou sistema protegido pela senha possa ter, ou o pequeno prejuízo decorrente de um uso possivelmente mal-intencionado. Um segundo motivo é alguma necessidade urgente, alguma situação que exija o compartilhamento desse segredo para a obtenção de uma finalidade maior. E o terceiro e mais nobre dos motivos resume-se a uma simples palavra: confiança.
Confiança é algo difícil de definir em toda sua amplitude, mas é algo bom de ser sentido. Mas é fácil trazer à tela com exemplos. Confiança é precisar de compartilhar uma senha de correio eletrônico ou de acesso a sistemas e saber que não terá a privacidade invadida, nem será alvo de atitudes maliciosas ou fraudulentas. Claro, nem sempre haverá tal necessidade mas, existindo, como é bom e gratificante saber que se pode contar contar com a ajuda de outra pessoa, e que a informação passada está segura e a salvo.
Mas confiança vai muito além de exemplos da vida digital. Pode ser também emprestar algo valioso, afetiva ou financeiramente. Emprestar uma coleção de discos importados do filme preferido, precioso, é também uma forma de demonstrar esse crédito. E se os discos fossem danificados? A confiança está não apenas depositada no desejado zelo que o depositário tomará, mas também na sua atitude caso ocorra algum problema. Simples assim. E dessa mesma forma, um carro pode ser emprestado, tanto para uma noitada amorosa de um amigo, quanto para outro que dele necessite para uma longa viagem profissional.
Uma das formas mais simples e, ao mesmo tempo, controversa e profunda da demonstração desse sentimento, é o empréstimo de uma escova de dentes a um amigo. A escova de dentes é tida como algo muito íntimo, indevassável, que não pode ser passada a outra boca que não a do proprietário. Puro tabu! Se o amigo é confiável e se seus hábitos sanitários são conhecidos e adequados, é muito melhor pedir-lha emprestada do que passar um turno com a boca sendo devastada por açúcares e suas fermentações. Claro que essa não é uma situação ideal, mas é uma possibilidade de higiene que deve ser considerada. Para os assombrados, ela pode ter o impacto psicológico atenuado pela comparação com um simples beijo. Se o amigo é digno de ser beijado (por alguém), então é digno de receber (ou ceder) a escova. No fim, apenas uma questão de confiança, com as vantagens de refrescância e de anti-sepsia da pasta dental.
22 de mai. de 2007
Da Inveja
Durante a infância tive muitos amigos que, de alguma forma, mantinham estreitas ligações com seus irmãos. Acredito que a pouca diferença de idade entre eles favorecia esse entendimento, embora também pudesse criar clima de disputa, principalmente mais tarde, na adolescência. Dentre os amigos que agregavam seus irmãos ao meu círculo de amizade, posso citar o Marcelo e a Fernanda; depois o Roberto com o Carlos; depois o André com o Rafael; eles conseguiam interagir de uma maneira que eu não podia, ou não conseguia, com os meus. Mais do que isso, partilhavam de interesses comuns e se defendiam de inimigos externos, muitas vezes representados pelo controle dos pais.
Eu não tinha essa vivência em casa. Meu irmão e minha irmã, ambos um tanto mais velhos do que eu, viviam preocupados com seus próprios problemas ou criando alguns para mim. O ambiente era permanentemente conflituoso. Lembro-me de fazer conchavos com um ou outro conforme o decorrer das brigas e disputas (anos depois, fui perceber uma analogia dessa situação com as "eternas" guerras e alianças entre Eurásia, Lestásia e Oceania, do livro 1984). Além disso, havia um clima de delação: o deslize de algum era imediatamente reportado à autoridade vigente ou usado como argumento em alguma chantagem.
Essa situação me incomodava, e era mais um fator que me fazia procurar abrigo afetivo fora de casa. Amigos foram tornando-se cada vez mais importantes e, ao mesmo tempo, como causa e efeito, meu diálogo familiar diminuía. Devo admitir, entretanto, que muitas vezes busquei conforto emocional na minha irmã, que prontamente me socorreu. Com o tempo, acabei criando com ela o mais forte vínculo dentre meus familiares.
Dessa maneira, fui buscando nos amigos os laços fraternos mais fortes, o que muitas vezes me deixava numa posição de dependência ou de deslocamento. Por melhor que um amigo seja, ele não tem o compromisso de um irmão e, na maioria da vezes, não quer ter. Uma boa comparação seria dizer que irmãos são como cães: podem latir, morder, mas sempre estão à volta; já amigos são como gatos: são mais graciosos, divertidos, mas também mais ariscos, e não se pode contar muito com eles.
E ultimamente tenho reparado nisso, nesse binônio "amigo-irmão", mistura de compromisso formal sangüíneo e dedicação espontânea e desinteressada. No exemplo dos irmãos que tocam violão e cantam de noite no quarto; ou daqueles que camuflam uma garrafa de uísque como presente para poder beber até cair num bar (e agora o caçula lamenta a falta do outro, que se mudou para longe); ou da cumplicidade daqueles que, como numa traquinagem, batem e consertam o carro, escondidos, para os pais não ficarem sabendo. Tudo isso me faz sentir uma inveja parda, uma admiração nostálgica de algo bom e profundo que não tive.
Eu não tinha essa vivência em casa. Meu irmão e minha irmã, ambos um tanto mais velhos do que eu, viviam preocupados com seus próprios problemas ou criando alguns para mim. O ambiente era permanentemente conflituoso. Lembro-me de fazer conchavos com um ou outro conforme o decorrer das brigas e disputas (anos depois, fui perceber uma analogia dessa situação com as "eternas" guerras e alianças entre Eurásia, Lestásia e Oceania, do livro 1984). Além disso, havia um clima de delação: o deslize de algum era imediatamente reportado à autoridade vigente ou usado como argumento em alguma chantagem.
Essa situação me incomodava, e era mais um fator que me fazia procurar abrigo afetivo fora de casa. Amigos foram tornando-se cada vez mais importantes e, ao mesmo tempo, como causa e efeito, meu diálogo familiar diminuía. Devo admitir, entretanto, que muitas vezes busquei conforto emocional na minha irmã, que prontamente me socorreu. Com o tempo, acabei criando com ela o mais forte vínculo dentre meus familiares.
Dessa maneira, fui buscando nos amigos os laços fraternos mais fortes, o que muitas vezes me deixava numa posição de dependência ou de deslocamento. Por melhor que um amigo seja, ele não tem o compromisso de um irmão e, na maioria da vezes, não quer ter. Uma boa comparação seria dizer que irmãos são como cães: podem latir, morder, mas sempre estão à volta; já amigos são como gatos: são mais graciosos, divertidos, mas também mais ariscos, e não se pode contar muito com eles.
E ultimamente tenho reparado nisso, nesse binônio "amigo-irmão", mistura de compromisso formal sangüíneo e dedicação espontânea e desinteressada. No exemplo dos irmãos que tocam violão e cantam de noite no quarto; ou daqueles que camuflam uma garrafa de uísque como presente para poder beber até cair num bar (e agora o caçula lamenta a falta do outro, que se mudou para longe); ou da cumplicidade daqueles que, como numa traquinagem, batem e consertam o carro, escondidos, para os pais não ficarem sabendo. Tudo isso me faz sentir uma inveja parda, uma admiração nostálgica de algo bom e profundo que não tive.
4 de abr. de 2007
Bruno, o Questionável
E agora, Bruno?
Sem bolachinhas para comer no corredor,
Sem capuccino para beber,
Quer ir para Tóquio,
Mas Tóquio não existe mais.
Fugir do Jacu já não pode,
Os chamados fugiram também.
Sem perdigotos que voem além,
Sem a cerveja quente daquele bar,
Não há mais mesa onde o dedo possa bater,
Nem mais apostas há para se fazer.
E agora, Bruno?
E agora, você?
Você que zomba dos outros,
Que faz chacotinhas,
Que bebe, e chora?
É o verme rastejante
Da arraia-miúda.
Onde escondeu o glamour?
Onde perdeu o requinte?
A Biba fugiu,
O Zanza fugiu,
O Dé fugiu,
O Becker também fugir irá.
O Adriano estudou,
O Lucas passou,
O Moisés ligou,
O Dêilor mijou,
E a multa não veio.
E agora, Bruno?
Irá para o abraço
Dos seus amigos,
Vá buscar o conforto
Nos seus livros.
A sinuca o espera,
O concurso o espera,
O Vinícius o espera.
Esperar é o que já não pode.
Ainda que a inércia lhe doa,
Saiba que lá no fundo
há de ser boa pessoa!
Sem bolachinhas para comer no corredor,
Sem capuccino para beber,
Quer ir para Tóquio,
Mas Tóquio não existe mais.
Fugir do Jacu já não pode,
Os chamados fugiram também.
Sem perdigotos que voem além,
Sem a cerveja quente daquele bar,
Não há mais mesa onde o dedo possa bater,
Nem mais apostas há para se fazer.
E agora, Bruno?
E agora, você?
Você que zomba dos outros,
Que faz chacotinhas,
Que bebe, e chora?
É o verme rastejante
Da arraia-miúda.
Onde escondeu o glamour?
Onde perdeu o requinte?
A Biba fugiu,
O Zanza fugiu,
O Dé fugiu,
O Becker também fugir irá.
O Adriano estudou,
O Lucas passou,
O Moisés ligou,
O Dêilor mijou,
E a multa não veio.
E agora, Bruno?
Irá para o abraço
Dos seus amigos,
Vá buscar o conforto
Nos seus livros.
A sinuca o espera,
O concurso o espera,
O Vinícius o espera.
Esperar é o que já não pode.
Ainda que a inércia lhe doa,
Saiba que lá no fundo
há de ser boa pessoa!
23 de mar. de 2007
Oito maneiras de melhorar o Brasil: política
- Todos os cargos eletivos devem ter mandato de 5 anos, para melhor implementar políticas estruturais. Quatro anos é pouco, e oito anos é um exagero.
- Todas as eleições devem ser feitas simultaneamente, acabando com a bagunça eleitoreira que paralisa o país a cada dois anos.
- Os mandatos devem ser dos partidos. Candidato eleito que quiser trocar de partido, perde o mandato.
- Ninguém deve poder se candidatar ao mesmo cargo consecutivamente. Isso evita a profissionalização vil dos políticos e a personalização dos mandatos.
- Voto distrital urgente: o país (e os estados) é (são) divididos em “distritos eleitorais”, todos com a mesma população e cada um desses distritos elege apenas um deputado. Isso acaba com os currais eleitorais, acaba com a distorção na representatividade do povo e, por fim, evita que candidatos bizarros e desconhecidos sejam eleitos na esteira de um campeão de votos apenas porque estavam no mesmo partido.
- A função de desembargador não pode ser um cargo vitalício. Um desembargador deve ser eleito entre os juízes de um determinado distrito, para um mandato de, também, 5 anos. Isso traz transparência ao Judiciário, tanto no quesito administrativo quanto jurídico.
- Para os cargos eletivos do Executivo e do Legislativo, deve ser aplicada uma prova de aptidão aos candidatos interessados, com questões relativas à administração pública, conhecimentos gerais, divisão e organização do estado e dos poderes. Preferencialmente, os candidatos devem ter ensino médio completo.
- Para os cargos executivos, deve haver política pública de incentivos que profissionais com competência adequada assumam as chefias. Um engenheiro na secretaria de obras, um médico cuidando da saúde e um economista cuidando da fazenda, por exemplo, trariam benefícios à toda comunidade e diminuiriam a politicagem vigente.
22 de mar. de 2007
Deus-abafo
Qualquer pessoa que empunhar a bíblia - ou qualquer outro livro sagrado - para embasar seus argumentos, receberá de mim a mesma consideração e apreço que dou a jumentos. Minto: aos jumentos tenho, com certeza, mais admiração e compreensão.
15 de mar. de 2007
O caos nosso de todo o dia
Um amigo meu, chamado Antônio, costumava falar uma frase sucinta mas de grande significado. Não me lembro das palavras exatas que permitiriam a concisão e o efeito impactante, mas ela dizia, mais ou menos, que o mal é a pura entropia, e o bem requer gasto de energia. Pode parecer uma papalvice física, mas o enunciado traz consigo algumas verdades sobre a vida humana, ou pelos menos, pontos para reflexão.
A entropia, tomada como sinônimo do próprio caos, da aleatoriedade, pode ser compreendida socialmente como a falta de uma orientação, de diretrizes específicas com o fim de manter e aprimorar um núcleo social. Assim, por exemplo, podemos considerar cada ser humano como um ente em busca de satisfazer suas necessidades ou vontades; na visão macroscópica, no conjunto dos entes, essas buscas mostram-se desorganizadas e conflituosas. Faz-se necessário, então, um emprego de energia com o fim explícito de resolver impasses, organizar os entes e buscar o bem comum. Essa energia é o estado, materialização da energia que a sociedade precisa despender em prol de si mesma, para viver em aceitável harmonia e avançar. A estrutura monstruosa do estado é onerosa e, por vezes, paradoxalmente sufocante. Mas seria possível existir civilização sem ele?
Claro, esse é um exemplo extremo da necessidade do gasto de energia, no caso, transformada em uma organização. Há também exemplos mais simples, como a tendência geral pelo mínimo esforço (a entropia). Podemos caminhar pelas ruas e atirar o lixo - uma lata vazia de refrigerante, por exemplo - na sarjeta. Essa é a solução mais simples, mas que causará estragos à natureza e, provavelmente, ao saneamento público. A alternativa correta, mas que gasta mais energia, é caminhar até uma lixeira, e lá depositá-lo. Outro exemplo é a compra de um produto contrabandeado, notavelmente mais barato. A economia de energia (dinheiro) é evidente, mas levará a problemas de arrecadação para o governo, com prováveis conseqüências nas áreas de segurança pública e geração de empregos. Podemos pensar também na organização de correspondências logo ao serem recebidas. Isso exige um empenho na hora e é mais fácil simplesmente acumulá-las sobre uma mesa. Depois, entretanto, essa simplificação cobrará seu preço, exigindo tempo adicional maior para uma derradeira arrumação.
Mas também podemos perceber esse fundamento nas relações humanas. Manter uma relação é custoso. Exige disposição para dialogar, para compreender, para resolver as querelas. Isso vale para amizades, namoros e todos os tipos de relacionamentos, inclusive os ligados por laços sangüíneos. É muito mais fácil deixarmos nos levar pelo orgulho ferido, pelo egoísmo aflorado, pelo tédio raivoso do que gastar tempo, saliva e massa encefálica buscando soluções e equilíbrio. É muito mais fácil, também, apaixonar-se pelo novo, por aquele que é encantador e desconhecido, mas que não tem compromisso, nem profundidade, do que investir numa paixão já explorada por alguém que já conhecemos e que igualmente nos conhece a fundo, para o bem e para o mal. Pois a monotonia do cotidiano, os pontos de vista diferentes e a imperfeição da índole humana atuam como forças de dilaceração sobre os relacionamentos; somente sobreviverão aqueles que investirem nas forças de coesão, e isso requer vontade e atitude, enfim, emprego de energia.
Para que as relações humanas e sociais sejam positivas, edificantes e sólidas, é necessário que não poupemos energia e disposição. Precisamos querer a continuação, a construção e o bem futuro e não desistir nos reveses, mandando tudo às favas. Caso contrário, teremos relações superficiais e imediatistas, com efeitos colaterais indesejados ou mesmo nocivos a médio e longo prazos. Quando for cada um por si, o caos será contra todos.
A entropia, tomada como sinônimo do próprio caos, da aleatoriedade, pode ser compreendida socialmente como a falta de uma orientação, de diretrizes específicas com o fim de manter e aprimorar um núcleo social. Assim, por exemplo, podemos considerar cada ser humano como um ente em busca de satisfazer suas necessidades ou vontades; na visão macroscópica, no conjunto dos entes, essas buscas mostram-se desorganizadas e conflituosas. Faz-se necessário, então, um emprego de energia com o fim explícito de resolver impasses, organizar os entes e buscar o bem comum. Essa energia é o estado, materialização da energia que a sociedade precisa despender em prol de si mesma, para viver em aceitável harmonia e avançar. A estrutura monstruosa do estado é onerosa e, por vezes, paradoxalmente sufocante. Mas seria possível existir civilização sem ele?
Claro, esse é um exemplo extremo da necessidade do gasto de energia, no caso, transformada em uma organização. Há também exemplos mais simples, como a tendência geral pelo mínimo esforço (a entropia). Podemos caminhar pelas ruas e atirar o lixo - uma lata vazia de refrigerante, por exemplo - na sarjeta. Essa é a solução mais simples, mas que causará estragos à natureza e, provavelmente, ao saneamento público. A alternativa correta, mas que gasta mais energia, é caminhar até uma lixeira, e lá depositá-lo. Outro exemplo é a compra de um produto contrabandeado, notavelmente mais barato. A economia de energia (dinheiro) é evidente, mas levará a problemas de arrecadação para o governo, com prováveis conseqüências nas áreas de segurança pública e geração de empregos. Podemos pensar também na organização de correspondências logo ao serem recebidas. Isso exige um empenho na hora e é mais fácil simplesmente acumulá-las sobre uma mesa. Depois, entretanto, essa simplificação cobrará seu preço, exigindo tempo adicional maior para uma derradeira arrumação.
Mas também podemos perceber esse fundamento nas relações humanas. Manter uma relação é custoso. Exige disposição para dialogar, para compreender, para resolver as querelas. Isso vale para amizades, namoros e todos os tipos de relacionamentos, inclusive os ligados por laços sangüíneos. É muito mais fácil deixarmos nos levar pelo orgulho ferido, pelo egoísmo aflorado, pelo tédio raivoso do que gastar tempo, saliva e massa encefálica buscando soluções e equilíbrio. É muito mais fácil, também, apaixonar-se pelo novo, por aquele que é encantador e desconhecido, mas que não tem compromisso, nem profundidade, do que investir numa paixão já explorada por alguém que já conhecemos e que igualmente nos conhece a fundo, para o bem e para o mal. Pois a monotonia do cotidiano, os pontos de vista diferentes e a imperfeição da índole humana atuam como forças de dilaceração sobre os relacionamentos; somente sobreviverão aqueles que investirem nas forças de coesão, e isso requer vontade e atitude, enfim, emprego de energia.
Para que as relações humanas e sociais sejam positivas, edificantes e sólidas, é necessário que não poupemos energia e disposição. Precisamos querer a continuação, a construção e o bem futuro e não desistir nos reveses, mandando tudo às favas. Caso contrário, teremos relações superficiais e imediatistas, com efeitos colaterais indesejados ou mesmo nocivos a médio e longo prazos. Quando for cada um por si, o caos será contra todos.
14 de mar. de 2007
Fábula celeste
Certa feita havia uma estrelinha nova no céu. Dona Lua, que toda noite costumava parolar com suas vizinhas brilhantes, logo percebeu a nova comadre e pôs-se a perguntar:
- Oi, estrelinha! Como te chamas?
- Boa noite, Dona Lua. Eu sou a Isabelita.
- Que lindo nome tens, querida. De onde vens?
- Ah, eu venho duma galáxia distante, lá de baixo.
Intrigada com o súbito aparecimento da interlocutora, Dona Lua quis saber:
- Mas como vieste parar aqui em cima, tão alto no firmamento?
Ao que a estrelinha logo respondeu:
- Ah, Dona Lua. Foi um caminho muito duro. Eu vim trepando aqui, trepando ali...
Dona Lua enclipsou-se ruborizada. Era o fim dos tempos!
- Oi, estrelinha! Como te chamas?
- Boa noite, Dona Lua. Eu sou a Isabelita.
- Que lindo nome tens, querida. De onde vens?
- Ah, eu venho duma galáxia distante, lá de baixo.
Intrigada com o súbito aparecimento da interlocutora, Dona Lua quis saber:
- Mas como vieste parar aqui em cima, tão alto no firmamento?
Ao que a estrelinha logo respondeu:
- Ah, Dona Lua. Foi um caminho muito duro. Eu vim trepando aqui, trepando ali...
Dona Lua enclipsou-se ruborizada. Era o fim dos tempos!
30 de jan. de 2007
Novos tempos
A enfermeira chega ao médico e diz:
- Doutor, acredito que em breve o paciente do 201 vai estar realizando seu óbito.
Ao que o médico prontamente responde:
- Sim, ele executou uma operação ilegal e teve de ser finalizado. Não estava mais respondendo.
A enfermeira, entristecida, lamenta:
- Sinto muito. Pensei que a operação tivesse sido realizada com sucesso.
- Doutor, acredito que em breve o paciente do 201 vai estar realizando seu óbito.
Ao que o médico prontamente responde:
- Sim, ele executou uma operação ilegal e teve de ser finalizado. Não estava mais respondendo.
A enfermeira, entristecida, lamenta:
- Sinto muito. Pensei que a operação tivesse sido realizada com sucesso.
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